23 de abril de 2007

História do autismo


Breve História Contextual ...

O termo autismo vem do grego “autós” que significa “de si mesmo”.

Em 1906, Plouller introduziu o termo autista na literatura psiquiátrica. Mas foi Bleuler, em 1911, o primeiro a difundir o termo autismo, referindo-se no entanto ao quadro de esquizofrenia, que consiste na limitação das relações humanas.
Em 1943, o psiquiatra americano Leo Kanner descreveu um grupo de onze casos clínicos de crianças na sua publicação intitulada “Distúrbios Autísticos do Contacto Afectivo” (Autistic Disturbances of Affective Contact).

As crianças investigadas por Kanner apresentavam inabilidade para se relacionarem com outras pessoas (extremo isolamento), falha no uso da linguagem para a comunicação e desejo obsessivo ansioso para a manutenção da “mesmice”.

Segundo Kanner, o autismo era causado por pais altamente intelectualizados, pessoas emocionalmente frias e com pouco interesse nas relações humanas da criança.

Em 1944, o pediatra austríaco Hans Asperger, em Viena, descreveu crianças que tinham dificuldades de integrar-se socialmente em grupos, denominando esta condição de “Psicopatia Autística” para transmitir a natureza estável do transtorno. Estas crianças exibiam um prejuízo social demarcado, e assemelhavam-se com as descritas por Kanner, porém mantinham a linguagem bem preservada e pareciam mais inteligentes. Entretanto, Asperger acreditava que elas eram diferentes das crianças com autismo na medida em que não eram tão perturbadas, demonstravam capacidades especiais, desenvolviam fala altamente gramatical, numa idade precoce, não apresentavam sintomas antes do terceiro ano de vida e tinham um bom prognóstico.

A publicação de Kanner ficou conhecida, enquanto que o artigo de Asperger, escrito em alemão, só foi transcrito para o inglês por Lorna Wing, em 1981.

O transtorno de Asperger diferencia-se do autismo essencialmente pelo facto de que não é acompanhado por retardo ou deficiência na linguagem ou no desenvolvimento cognitivo.

A diferença fundamental entre um indivíduo com autismo de alto funcionamento e um indivíduo com transtorno de Asperger é que o indivíduo com autismo possui um QI executivo maior que o verbal e apresenta um atraso na aquisição da linguagem. Na prática clínica, a distinção fará pouca diferença, porque o tratamento e as intervenções dirigidas são semelhantes.

É relevante salientar que algumas das especulações da publicação original de Kanner, como a frieza afectiva dos familiares (particularmente a da mãe), da inteligência das crianças ser normal e de não haver presença de co-morbidade, com o tempo revelaram estar incorrectas.

Com a evolução das pesquisas científicas, concluiu-se que o autismo não é um distúrbio do contacto afectivo, mas sim um distúrbio do desenvolvimento.

Em 1976, Lorna Wing relatou que os indivíduos com autismo apresentam défices específicos em três áreas: imaginação, socialização e comunicação, o que ficou conhecido como “Tríade de Wing”.

O autismo é um transtorno definido por alterações presentes antes dos três anos de idade e que se caracteriza por alterações qualitativas na comunicação, na interacção social e no uso da imaginação, como de seguida iremos abordar mais pormenorizadamente.

Definição de Autismo

DEFINIÇÃO DA AUTISM SOCIETY OF AMERICAN – ASA (1978)
(Autism Society of American = Associação Americana de Autismo)

O autismo é uma inadequação no desenvolvimento que se manifesta de maneira grave por toda a vida. É incapacitante e aparece tipicamente nos três primeiros anos de vida. Acomete cerca de 20 entre cada 10 mil nascidos e é quatro vezes mais comum no sexo masculino do que no feminino. É encontrado em todo o mundo e em famílias de qualquer configuração racial, étnica e social. Não se conseguiu até agora provar qualquer causa psicológica no meio ambiente destas crianças, que possa causar a doença.

Segundo a ASA, os sintomas são causados por disfunções físicas do cérebro, verificados pela anamnese ou presentes no exame ou entrevista com o indivíduo. Incluem:

1. Distúrbios no ritmo de aparecimentos de habilidades físicas, sociais e linguísticas.

2. Reacções anormais às sensações. As funções ou áreas mais afectadas são: visão, audição, tacto, dor, equilíbrio, olfacto, paladar e a postura corporal.

3. Fala e linguagem ausentes ou atrasadas. Certas áreas específicas do pensar, presentes ou não. Ritmo imaturo da fala, restrita compreensão de ideias. Uso de palavras sem associação com o significado.

4. Relacionamento anormal com os objectos, eventos e pessoas. Respostas não apropriadas a adultos e crianças. Objectos e brinquedos não são usados de maneira própria.

Fonte: Gauderer, E. Christian. Autismo e outros atrasos do desenvolvimento: guia prático para pais e profissionais. Rio de Janeiro: Revinter; 1997. pg 3.


DEFINIÇÃO DO DSM-IV-TR (2002)

O Transtorno Autista consiste na presença de um desenvolvimento comprometido ou acentuadamente anormal da interacção social e da comunicação e um repertório muito restrito de actividades e interesses. As manifestações do transtorno variam imensamente, dependendo do nível de desenvolvimento e da idade cronológica do indivíduo.


DEFINIÇÃO DA CID-10 (2000)

Autismo infantil: Transtorno global do desenvolvimento caracterizado por: a) um desenvolvimento anormal ou alterado, manifestado antes da idade de três anos, e b) apresenta uma perturbação característica do funcionamento em cada um dos três seguintes domínios: interacções sociais, comunicação, comportamento focalizado e repetitivo. Além disso, o transtorno é acompanhado normalmente por numerosas outras manifestações inespecíficas, como por exemplo: fobias, perturbações de sono ou da alimentação, crises de birra ou agressividade (auto-agressividade).

Etiologia


A etiologia do autismo ainda não foi definida.

Não existe uma etiologia básica fundamental para todos os casos de autismo.

Os estudos demonstram, indiscutivelmente, que os factores biológicos estão implicados na etiologia do transtorno autista, embora não tenha sido ainda identificado um marcador biológico específico, assim como os factores genéticos têm um importância substancial na etiologia do autismo

Actualmente, sabe-se que o autismo não pode ser causado por factores emocionais e/ ou psicológicos.

Estudos sugerem também, que não existe nenhum alteração física no Sistema Nervoso Central que esteja directamente relacionado com a etiologia do autismo.

As diversas linhas de investigação sugerem que determinantes ambientais também desempenham um papel na origem do autismo.

Como vemos então as evidências apontam para a existem de uma etiologia multifactorial, que dificulta a abordagem e compreensão do autismo.

Diagnóstico

diagnóstico precoce

O diagnóstico precoce do autismo permite a indicação antecipada de tratamento. Os atendimentos precoces e intensivos podem fazer uma diferença importante no prognóstico do autismo.

A demora no processo de diagnóstico e aceitação, torna-se prejudicial ao tratamento, uma vez que a identificação precoce deste transtorno global do desenvolvimento permite um encaminhamento adequado e influencia significativamente a evolução da criança.

Os sistemas diagnósticos (DSM-IV e CID-10) têm baseado os seus critérios em problemas apresentados em três áreas, com início antes dos três anos de idade, que são:

a) comprometimento na interacção social;

b) comprometimento na comunicação verbal e não-verbal, e no “brincar imaginativo”;

c) comportamento e interesses restritos e repetitivos.


É relevante salientar que estas informações devem ser utilizadas apenas como referência. Nunca se deve rotular um criança, impondo-lhe todas as limitações desse “rotulo”, sem antes se comprovar a afecção de um modo fundamentado.


OrientaçÕES para a elaboração do Diagnóstico

Recomenda-se:

· Caracterizar a queixa da família: sinais, sintomas, comportamento, nível de desenvolvimento cognitivo e escolar do indivíduo - quando for o caso, relacionamento inter-pessoal;

· Investigar os antecedentes gineco-obstétricos, história médica pregressa, história familiar de doenças neurológicas, psiquiátricas ou genéticas;

· Analisar os critérios do DSM-IV-TR ou da CID-10;

· Realizar avaliações complementares (investigações bioquímicas, genéticas, neurológicas, psicológicas, pedagógicas, fonoaudiológicas, fisioterapêuticas);

· Pensar a respeito do diagnóstico diferencial;

· Investigar a presença de co-morbidades,

· Classificar o transtorno, planear e efectivar o tratamento.

Muitas vezes, o autismo é confundido com outras síndromas ou com outros transtornos globais do desenvolvimento, pelo fato de não ser diagnosticado através de exames laboratoriais ou de imagem, ou por não haver marcador biológico que o caracterize, nem necessariamente sinais morfológicos específicos; o processo de reconhecimento do autismo é dificultado, o que dificulta a sua identificação e respectivo diagnóstico precoce.

Um diagnóstico preciso deve ser realizado, por um profissional qualificado, baseado no comportamento, anamnese e observação clínica do indivíduo.

O autismo pode ocorrer isoladamente, ser secundário ou apresentar condições associadas, razão pela qual é extremamente importante a identificação de co-morbidades bioquímicas, genéticas, neurológicas, psiquiátricas, entre outras.


Diagnóstico Diferencial

Períodos de regressão podem ser observados no desenvolvimento normal, porém estes não são tão graves nem tão prolongados como no transtorno autista, e por isso devem ser diferenciados de outros transtornos globais do desenvolvimento. Entre eles destacam-se:

· Transtorno de Rett

· Transtorno Desintegrativo da Infância

· Transtorno de Asperger

· Esquizofrenia com início na Infância

· Mutismo Selectivo

· Transtorno da Linguagem Expressiva

· Transtorno Misto da Linguagem Receptivo-Expressiva

· Transtorno de Movimentos Estereotipados

· Retardo Mental

Descrição Clinica

SINTOMAS DO INDIVÍDUO COM AUTISMO

Segundo a ASA (Autism Society of American), indivíduos com autismo usualmente exibem pelo menos metade das características listadas a seguir:

1. Dificuldade de relacionamento com outras crianças;

2. Riso inapropriado;

3. Pouco ou nenhum contacto visual;

4. Aparente insensibilidade à dor;

5. Preferência pela solidão;

6. Rotação de objectos;

7. Inapropriada fixação em objectos;

8. Perceptível hiperactividade ou extrema inactividade;

9. Ausência de resposta aos métodos normais de ensino;

10. Insistência em repetição, resistência à mudança de rotina;

11. Não tem medo do perigo real (consciência de situações que envolvam perigo);

12. Comportamento com poses bizarras (fixar objecto ficando de cócoras; colocar-se de pé numa perna só; impedir a passagem por uma porta);

13. Ecolalia (repete palavras ou frases em lugar da linguagem normal)

14. Recusa colo ou afagos

15. Age como se estivesse surdo

16. Dificuldade em expressar necessidades - usa gesticular e apontar no lugar de palavras

17. Acessos de raiva - demonstra extrema aflição sem razão aparente

18. Irregular habilidade motora - pode não querer chutar uma bola, mas pode arrumar blocos

OBS.: É relevante salientar que nem todos os indivíduos com autismo apresentam todos estes sintomas, porém a maioria dos sintomas está presente nos primeiros anos de vida da criança. Estes variam de leve a grave e em intensidade de sintoma para sintoma. Adicionalmente, as alterações dos sintomas ocorrem em diferentes situações e são inapropriadas para sua idade.


COMPORTAMENTOS DO INDIVÍDUO COM AUTISMO

(Segundo a ASA)


Problemas Associados ao Autismo


CONDIÇÕES QUE PODEM ESTAR ASSOCIADAS AO AUTISMO:

· Acessos de raiva;

· Agitação;

· Agressividade;

· Auto-agressão, auto-lesão (bater na cabeça, morder os dedos);

· Ausência de medo em resposta a perigos reais;

· Catatonia;

· Complicações pré, peri e pós-natais;

· Comportamentos autodestrutivos;

· Défices de atenção;

· Défices auditivos;

· Défices na percepção e coordenação motora;

· Défices visuais;

· Epilepsia (Síndrome de West);

· Esquizofrenia;

· Hidrocefalia;

· Hiperactividade;

· Impulsividade;

· Irritabilidade;

· Macrocefalia;

· Microcefalia;

· Mutismo selectivo;

· Paralisia cerebral;

· Respostas alteradas a estímulos sensoriais (alto limiar doloroso, hipersensibilidade aos sons ou ao toque, reacções exageradas à luz ou a odores, fascinação com certos estímulos);

· Retardo mental;

· Temor excessivo em resposta a objectos inofensivos;

· Transtornos de alimentação (limitação a comer poucos alimentos);

· Transtornos de ansiedade;

· Transtornos de linguagem;

· Transtorno de movimento estereotipado;

· Transtornos de tique;

· Transtornos do humor/afectivos (riso ou choro imotivados, aparente ausência de reacção emocional);

· Transtornos do sono (despertares nocturnos com balanço do corpo).


Tratamento do Autismo

INTERVENÇÂO TERAPÊUTICA

O quadro de autismo não é estático, alguns sintomas modificam-se, outros podem amenizar-se e vir a desaparecer, porém outras características poderão surgir com a evolução do indivíduo. Portanto aconselham-se avaliações sistemáticas e periódicas.

É fundamental o investimento na pessoa com autismo, toda a intervenção produzirá benefícios significativos e duradouros.

A gravidade do autismo oscila bastante, porque as causas, não sendo as mesmas, podem produzir significativas diferenças individuais no quadro clínico.

O transtorno autista é permanente, até o momento presente, não tem cura, não existe medicação, nem tratamento específicos para o transtorno autista.

O tratamento que se considera mais adequado é baseado na consideração das co-morbilidades para a realização de atendimento apropriado em função das características particulares do indivíduo.

O envolvimento da família é essencial para a intervenção terapêutica na criança autista. O tratamento deverá ser realizado através da actuação de uma equipa multidisciplinar que inclua no tratamento uma vertente tanto médica como a não-médica diferentes áreas de actuação (pediatria, neurologia, psiquiatria e odontologia, psicologia, fonoaudiologia, pedagogia, terapia ocupacional, fisioterapia e orientação familiar), auxiliando a criança a uma inclusão social mais facilitada uma vez que a intervenção apropriada resulta em considerável melhoria do prognóstico.

A farmacoterapia continua a ser a componente mais importante num programa de tratamento, porém nem todos indivíduos necessitarão de utilizar uma terapêutica medicamentosa.

O sucesso do tratamento depende exclusivamente do empenho e qualificação dos profissionais que se dedicam ao atendimento destes indivíduos. Os indivíduos com autismo têm uma expectativa de longevidade normal.

Adaptado de: http://www.autismo.br

Sites Recomendados

Consideramos pertinente colocar à disposição dos leitores desta partilha, alguns sites que contêm informação interactiva, que permitem não só compreender esta perturbação infantil, como também despoletar consciência para alguns aspectos que não são perceptíveis numa abordagem fundamentalmente teórica.